quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Sem poesia



Senhor, perdoa-me o despautério!
Devolvo-te a inspiração.
Sinto cometer um adultério
traindo a voz do coração.
Meus versos perderam a alegria,
caminham sisudos pela poesia,
meus lábios não dizem o que sinto,
contradiz, minhas palavras, meu olhar.
Tento enaltecer o amor,
que de tão raro se codificou,
quero descrever o belo
que perdeu o viço e se esfacelou.
Perdi-me no compasso, tropecei nas rimas,
fugi de meu estilo buscando o que me anima,
e a cada passo um descompasso me abomina
e o poema segue falso, sem autoestima.
Por isso, meu Senhor, me encontro à deriva...
Pra que inspiração se falta emoção?
Pra que a poesia se já não há fantasia?
Não sei se me perdi ou me perdeu a vida.

Carmen Lúcia

22/09/2009

Morre o poeta?



Morre o poeta?

(para Nathan de Castro)

_in memoriam_



Morre o poeta.
Morre?
Seria morte a canção que canta
as estações da vida em alto e brando som?
Seria morte a flor que anuncia
 a primavera vindo no jardim do amor,
cântico dos cânticos, em versos,
nascidos de seu criador?

Morre a alegria da inspiração
cantando em versos a voz do coração?
Morre o orvalho das manhãs
ao chorar o que na noite se perdeu
e numa lágrima amena, apenas,
desabafar a dor de quem sofreu?

Morre o poeta?
E as rimas que bailam, que pairam
tangendo os vazios, a vida inteira?
Ritmam os versos em cada final 
em cadência suave ou zombeteira,
 tornando-se imortal.
E a poesia extravasada da euforia...
não coube no peito, quis se rebelar...
falar de tudo, sem contudo realmente falar.

Não, o poeta não morre.
Muda de lugar.
Como o brilho da estrela, se perpetua.
Voa para o céu, se aventura.
Onde quer que vá
a luz lhe alcançará
e nos guiará.


_Carmen Lúcia_




quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A máscara nossa de cada dia



Em tudo que há de triste
a tristeza ainda persiste
e insiste em me azucrinar.
 O pior é que não mudo,
ocupo os espaços para me acomodar,
alastro a mania de ser triste,
escalo o escuro do mundo,
fecho os olhos como se fugisse,
pouso em qualquer canto como se agisse
para me( in)socializar,
faço-me muda pra não ter que falar
feito mosca morta matada
da comida saciada pelos magnatas
que nunca se fartam de se fartar.

Em tudo que há de triste
sobra nada...
Sociedade estagnada,
dignidade disfarçada
num sorriso (in)convincente
atrás de cada máscara
adequada a cada dia,
a cada sórdida atitude
inserida numa linda melodia.
E a alegria chora distante
vendo o mundo galopado por abutres
exalando o conteúdo acre
destilado de seus fraques,
 sociáveis seres galopantes.

Cruzo os braços e me calo.
Num galope resfolegante
bato em retirada,
 me esvaio, me resvalo
e me tranco no escuro...
entre a sordidez e o mundo
faço um muro.


_Carmen Lúcia_