quarta-feira, 20 de abril de 2016

Poder de decisão





Então decidi
ser o meu próprio sol,
não mais sentir o vazio do frio
nem a ausência do arrebol…
Ter a verve da vida em meu coração
a pulsar sem parar, em translação,
toda a sensibilidade que se faz arte
e dela fazer parte… Ou tentar.

Ter no olhar o brilho da estrela
a morrer aqui e nascer acolá
deixando rastros de poeira cósmica
sabendo que vai voltar,
derramando versos que não se aquietam,
transitam esquinas do universo,
transbordam almas a procurar
o ancoradouro mais seguro,
lugar para pousar.

Ser a tinta e o pincel
a me esboçar em tela crua,
esquálidas fragilidades, a granel,
já que aparência engana,
não se perpetua.
Então nua me deixo projetar,
 essência do que valeu guardar ,
 o  que ficou sem revelar…

Ser a minha própria estação,
outono ou primavera,
colher o fruto da imaginação,
vislumbrar a flor mais bela.
Brisa a me refrescar no verão,
manta no inverno a acalentar.

Ser a minha consciência
a badalar razão e ciência.
 Errar sem abstinência,
mas procurar acertar.


(Carmen Lúcia)


sábado, 9 de abril de 2016

Reencontro


Reencontro




Ainda ouço teus passos se distanciando,
perdendo-se na esquina que te engolia,
tragando-te afoita,  droga  à revelia,
mutilando uma história que ainda aconteceria.

Sibilam em meus ouvidos as badaladas de um sino
marcando as horas, trilha sonora que estribilha
rasgando-me a carne, mostrando meus avessos,
tendo a lua a compactuar com meus tropeços.

Ainda ouço o estardalhaço dos soluços
que meus lábios apertados tentaram segurar
e num sôfrego vazaram, desabados,
num choro compulsivo, sem parar.

Fostes...simplesmente foste,
 (como sempre foste),
sem medires a proporção do estrago,
a dimensão de inconsequente ato
carregando sobretudo, tudo...

Talvez me reencontre sem teu disfarce
e me resgate algum ancoradouro...
Corpo e alma num inusitado encontro, sem ais...
e o silêncio do luar oculto na névoa de um cais.

_Carmen Lúcia_
 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Em tempo...







Tempo de ir se despedindo da vida,
aos poucos, sem pressa nem letargia,
 gerúndio a divagar em qualquer tempo
colhendo a safra mais esperada,
saboreando o fruto doce e oriundo
de muitos outonos belos e profundos
lacrados na memória, na história
perpetuada de essências vibratórias,
construída a duras penas
ou em situações amenas
em que suor e brisa compõem o aprendizado
num morde e assopra, ri e chora,
 sonho que vai e vem 
num campo que aflora e deflora.

Tempo de diminuir a marcha,
apreciar cada detalhe que passa
pela visão de quem olha e vê , sente e pressente
o vaivém do tempo que só vai, não vem.
Tempo de respirar aliviada pelo que fez,
ou lamentar o que não pôde e se desfez…
Caminhar devagar numa entrega absoluta,
sem luta, num passeio que se permitiu ganhar,
na malemolência, quebrando o ritmo do dia,
o compasso  dominado pelas horas
onde cada minuto é um tempo a cumprir,
onde é punido o segundo que escapulir…

A canção, trilha sonora,
toca suavemente lá fora
a melodia que irradia
relatos de sua história.

(Carmen Lúcia)