sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Retrato da vida


















Num canto da sala balança a cadeira.Por cima dos óculos observa.Não dá palpites.
A rotina diária,algazarra, correria. Todos apressados, em tropeços, passam por ela.
Sequer percebem que ela percebia.Olha a todos e a tudo.Sem que ninguém a veja.
Os dedos já cansados esboçam um bordado.Parecem mecanizados, de tão acostumados a esses traçados.Chegam à perfeição.
Seu rosto, sem expressão, semblante enrugado, são marcas que ficaram, presentes do tempo.
Um tempo ausente que corre lá fora.Agora mais veloz, levando embora a vida, que ela vê caminhar, além da janela, afastando-se cada vez mais.
Veem-lhe as lembranças.Ricas lembranças.Criança correndo pelo campo, sem tempo, sem marcas, só esperança.Só risos.Sonhos.Fantasias.
Então cerra os olhos.Começa a imaginar.Ouve uma música suave.Esboça um doce sorriso e se pega a rodar, a girar por entre flores, pés descalços na grama úmida...com o vento acariciando seu rostinho de criança feliz.De repente a criança põe-se a correr para um lugar belíssimo, indescritível, inimaginável...
A cadeira já não balança.Permanece imóvel no canto da sala.
Caído ao chão, um bordado perfeito e já terminado.
Repousa de lado aquele rosto sem expressão, marcado agora pela morte.
A lida prossegue lá fora. E lá dentro, a rotina de sempre.É a vida!
Ninguém percebe a partida.

_Carmen Lúcia_

Retrato Pequena narrativa postada lá atrás, no tempo da saudosíssima comunidade do Orkut “Navegantes das Estrelas”.Criada para uma competição. Se ganhei? Não importa. O importante é que participei.

domingo, 17 de dezembro de 2017

Hoje



























O Hoje veio me acordar.
Trouxe- me flores.
Tirou-me da linha do tempo,
deu-me à uma pausa.
Convidou-me para dançar,
sorrir, cantar
até a emoção transbordar.
Vimos o sol nascer,
 resplandecer,
desmaiar.
O horizonte se encontrar
com vestígios do dia
e abraçar a noite
pedindo-lhe para ficar.
Apagamos as luzes.
Cada um deixou a sua brilhar.
Éramos estrelas brilhando sonhos,
sem estresses enfadonhos,
sem mesmices costumeiras.
Em cada esquina
uma poesia traçava
rotas  diferentes,
 lembrando que ainda é hoje,
 a gente é gente.
E o hoje traz a certeza
 do que irá acontecer.
 O amanhã, quem sabe,
traga versos que o poeta
ainda irá escrever.
Traga o hoje pra se viver.

Carmen Lúcia






sábado, 16 de dezembro de 2017

Toques finais



























Faltou suavisar o riso.
Teso, não convenceu,
  não condisse com o olhar.
Se perdeu.

Faltou mais brilho no olhar.
Sem sequer disfarçar
pegou carona num sonho
fora de ar.

Faltou acreditar mais.
Burburinhos desconstroem.
Lançam dúvidas.
Sonhos morrem.

Faltou seguir os arrojos.
Sem chão os pés resvalam.
O tempo prepondera
e ele passou.

Faltou a eloquência dos fatos
plausíveis à sequência perfeita
da vida sem disfarces.
Ultrapassar o primeiro ato.
Ação desfeita.

Faltou probabilidade.
O impacto da verdade.
Um toque de dor.
Fazer a vida andar.
E ela naufragou.



Carmen Lúcia


quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Alma feminina



























Aos nãos da vida disse sim.
À intolerância preconceituosa
a ditar uma vida desastrosa
não mais se irá curvar.
Agora sua alma rege normas.
À sociedade hipócrita vira as costas.
e tão feminina consegue se apresentar,
sem o peso da masculinidade imposta
sobre um corpo onde a delicadeza
divina veio se perpetuar.
Feito menina, vira bailarina.
Tão frágil, tão ela, tão rima…
Esquece o engodo que o acometera.
Nas pontas dos pés saltita e gira.
No palco, as amarras de uma vida falsa.
Na valsa, uma nova vida se anuncia.
Afinal, Luísa ou Luís?
O importante é ser feliz!



Carmen Lúcia

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Ao "Poeta das Rosas" (Homenagem Póstuma)




























Dizem que as rosas não falam,
porém hoje exalam orvalhos de dor,
lágrimas choradas como se falassem
a saudade sentida de seu grande amor…
Partiste, deixando o sonho inacabado,
compartilhado com mil desejos
de contigo também sonhar.
E as rosas desabaram
exaurindo fragrâncias de seu autor…
Cravaram caminhos de pétalas,
beiraram de cores teu andor,
foram contigo cantando versos
afagando feridas,
bendizendo teu regresso
à casa onde um dia
 retornaremos
para vivermos outros sonhos
sem lágrimas ou despedidas,
sem dores ou partidas,
somente rosas floridas,
perfumadas, coloridas,
nas que te inspiraste
e num gesto de amor,
poetizaste.



Carmen Lúcia



segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Nova vida






















Liberto a dor.
Debatia-se.
Doía.
Queria sair.
Abri a cancela.
Ela se foi.
Livre, perdeu o rancor.
Tornou-se leve.
Não mais se atreve.
Levou bagagens.
Feridas, marcas, amargor…
Contendas geradas pelo desamor.
Abriu fendas.
A luz invade.
Cura cicatrizes.
Novas diretrizes
vêm pra demarcar.
Foca a alma.
Toca o coração.
Conduz à nova vida.
Ressurreição.

Carmen Lúcia



sábado, 2 de dezembro de 2017

Fatos ou suposições?





























Essa vontade de muros,
de ninguém ultrapassar.
Esse mundo que é nosso
e não ter onde morar,
política da má vizinhança,
egoísmo a tripudiar…
O suicídio da esperança,
desequilíbrio no amar…
O estio sem cigarra
agourando se a chuva virá,
tanta sede a desandar
sobre a terra que desarvora,
 a Mãe-Terra que não chora
por não ter o que chorar.
O elo de alianças rompido,
o desgoverno corrompido…
Num dia o rio corre,
noutro, morre sem ver o mar.
Tudo me faz refletir:
Qual será nosso porvir?
O que ainda está por vir?
Amanhecerá? 
A manhã será?
O sol ainda brilha…
Haverá?



Carmen Lúcia