sábado, 27 de abril de 2013

A última estrela





 A última estrela

O  dia amanhece após infindável noite
marcada pela presença tediosa da insônia.
A última estrela apaga suas luzes
cega pelo farol do sol que desponta.
Submissa ao sistema recolhe-se à reclusão
para ressurgir nova em nova missão.

Tal rotina não a obstina.Dócil e matreira
oferece à nova noite a doação rotineira.
Brilhar sempre, enquanto brilho tiver...
Brilho que é seu,  oferenda para o céu
a abraçar os insones, suavizando suas noites
até que olhos afoitos lhe sorvam  a luminosidade
e um dia ela se acabe
perdendo-se na soturna escuridão...

Olhos que por ela se encantam
e obcecados  roubam-lhe a luz
refletida em lágrimas derramadas.
Despertos durante noites inteiras,
longas madrugadas, horas de solidão,
tendo como fiel companheira
a lucidez de uma estrela sem constelação.


_Carmen Lúcia_





segunda-feira, 22 de abril de 2013

Bailarinas




Leves, tão leves, mais leves que a própria  leveza,
Comparadas a uma linha tênue, sutil,
Levadas por um sopro, aragem febril,
Girando sempre, eternamente, sem partir,
Sem  ferir,sem dissuadir, sem iludir,
Sem realmente ir...

Asas invisíveis, voos indescritíveis,
 provam a si mesmas
a  não  gravitação entre Terra e céu,
entre corpo e alma,
entre céu e léu,
entre tudo e céu...
mundo a parte que reparte
enlevo,entrega,beleza, o surreal...

Pisam sem pisar, lançam de  mansinho
Sentimentos a fluírem em suave virada,
Chuva de prata, tamanha é a força da arte
Que dança, alcança o tudo e o nada
Povoando o vácuo com a postura
De quem sabe, quem inspira, quem lidera,
Quem ganha altura,
Quem espera o momento exato de descer
E tristemente encarar a vida
A girar sem rodopios,
A contundir a essência
Da coreografia –ironia –
Maculando as rimas, os versos
A sonoridade da melodia,
A poesia nascida das bailarinas.

_Carmen Lúcia_

terça-feira, 9 de abril de 2013

Perdida(mente)





Perdidamente, me pus em teu caminho.
Bebi tuas palavras, sorvi teus devaneios,
aspirei os teus suspiros, desvirtuei teu ninho,
sagrei os teus segredos, rompi teus entremeios.
Perdidamente, cruzei o teu destino,
lambi o teu suor, saboreei teu vinho,
desalinhei tua rota, arrombei a tua porta,
mudei a tua sina... em direção a minha...
Perdidamente, joguei-me em teus braços,
forcei os teus abraços, me ofereci a ti,
forjei teus sentimentos, ceguei-me à realidade
e entre delírios loucos...aí que me perdi!


                         (Carmen Lúcia)


quinta-feira, 4 de abril de 2013

Inalcançável





Caiu do céu...
Anjo sem asas, refez minha doutrina,
minha rotina...
Estendeu meu horizonte, se fez ponte
sobre o abismo que habitava em mim.
Plantou flores na aridez de meu solo
de onde agora decolo...
 
 
Amor perfeito, não fosse tanta perfeição
que minha imperfeição endeusa
e minha consciência acusa...
 
Pra minha amargura, o mel,
Pra minha aflição, a paz,
Pra minha indecisão, o caminho,
Para meu coração, bálsamo que refaz,
a própria liturgia grávida de significação,
homilia pregada em notas musicais
entoando, suavemente, os meus ais.
 
Olhar que perpassa sem me ver
indo além do que se possa crer...
Palavras que calam meu saber
e me ensinam o que não sei...
E não sei nada, não sou nada do que julgo ser.
 
Viver é muito mais que existir...
É amar, é sentir, se doar, repartir.
Alma transparente que é sua,
pura e não posso alcançar...
Sigo seu percurso, acato sua missão.
Só não sei discernir o amor da veneração.
 
Que culpa tenho, coração?
 


(Carmen Lúcia)
 

terça-feira, 2 de abril de 2013

Vento noroeste




Vens assim de repente
qual vento noroeste
que tudo desarruma e desveste,
mormaço quente, passional,
precedendo  temporal...
Redemoinho de efeitos
arrombando janelas,
varando por elas
como um vendaval...
Vens feito ciclone
desrespeitando espaços
desfazendo laços
varrendo ilusões...
Um festival de arroubos,
de impetuosidade rompante
nesse teu ar petulante...
És o dono da situação,
desnudas os sentimentos,
roubas os melhores momentos,
deixas marcas da paixão...
E vais assim como vens,
devastando os lugares
nublando céus
agitando mares
causando desolação...
Fruto da adversidade,
senhor da insensibilidade,
devorador de emoções.         

      _Carmen Lúcia-

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Sem palavras



Nos olhos, perfeita dissimulação, 
olhar sem direção pra não me entregar,
sem ter que encarar, fraquejar e implorar,
mantendo-me firme na proposta da  encenação.
 
Nos lábios um sorriso camuflado
amargando uma lágrima indiscreta
a arder o âmago, a salgar o cerne
de onde pulsa desenfreada dor...
 
A dor que permeia meu espaço
e passo a passo toma posse de meu ser.
Na garganta um nó fortemente atado
a sufocar palavras que não quero dizer,
sonoridade embargada pelo silêncio
que sempre calado há de permanecer.
 
Não revelo a fragilidade do sonho acabado
sem nunca sequer ter começado.
Quero que vás sem nunca saber
o que teu coração não conseguiu entender.
 
 
 _Carmen Lúcia_