terça-feira, 31 de julho de 2018

A vida em movimento






















Abre a janela.
Da alma e do mundo.
Lá fora o sol espelha.
Reflete o rosto dela.
O movimento da vida
convida a andar.
O som da natureza chama
sem falar.
Os jardins oferecem mel de seu labor.
Flores se dão, imensidão.
Captam olhar,
a mais recôndita emoção.
O perfume exalado inebria,
percorre caminhos intransitáveis.
Borboletas voam bailados,
esnobam cores, suavidade,
sedução,pecados…
Colibris levitam arrebatados.
Girassóis dispensam o sol,
 adornam o redor de seu cabelo.
Sobre a relva molhada,
os pés descalços
descarregam o stress da jornada.
O horizonte beija a terra.
A noite vem cobrindo o sol.
Hora do arrebol. Da nostalgia.
Não é noite nem dia.
Não espera a lua.
Nem sabe se virá.
Só a realidade
e o encantamento
de ter vivido o hoje.

Carmen Lúcia

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Sem limites





















Aberta aos amores,
amanheço.
Pensamentos se aglomeram
 espaçosos onde transito.
Desvaneço.
Sou cores sem nuances,
acordes sem canção,
caminhos sem atalhos…
Ávida aos prazeres
de compactuar com a lua
suas melhores fases,
sorver os anoiteceres.
A mente vai, o corpo não.
Já não acompanho o vento.
Quebrei meu violão.
O tempo me espera na esquina
(meio que à contramão)
onde meus sonhos adormecem.
Quero vivê-los outra vez.
Acordá-los para um samba-canção,
um rock a Janis Joplim,
um tango, el bandoneón.
Um blues em flauta doce,
uma cerveja, um agridoce.

Preciso parar as horas
que  limitam chegar.
Ainda falta tanto pra caminhar…
Falta uma vida…
Aquela que sonhei
e desperdicei
pedindo para me esperar.
Agora ela pede calma
e minha alma aflita, desalma,
em resistência às leis da existência.
Não terminei minha dança,
nem fui onde a emoção alcança.
Não colhi a flor da serra
 nem bebi água vertida,
não me tornei sal da terra,
não curti o bom da vida.
Mas o tempo não dá trela.
Adormeço.
A inquietude me vela.
Amanhã recomeço.


Carmen Lúcia



domingo, 29 de julho de 2018

Espelho


























Que espere a emoção!
Dê-me um tempo a inspiração.
Rasa de sensibilidade
encontro-me com a verdade
de cara lavada
sem máscara ou vaidade
frente ao espelho.
Quem sou?
Ele nunca revela.
O lado que mostra
é o que me prostra
e o que todos veem.
Retrato mal formulado
moldura sem essência
minha passiva armadura
defesa de meu ponto fraco.
Meu exterior de agruras
que tento esconder.
A fragilidade oculta
não deixa transparecer.
Minh’alma não espelha
e preciso saber
o que ela quer de mim.
Como mostrar-me nua
se a nitidez ofusca
e é o que quero transparecer?
Encobre as perfeições
mantidas bem guardadas
veladas, consagradas,
para os tempos de expiação.
Reflete as evidências,
o óbvio, as certezas…
Esconde o coração.


Carmen Lúcia


sábado, 28 de julho de 2018

Em silêncio


























Busco no silêncio, a paz
e a beleza natural que silencia,
onde a inspiração permeia
e a realidade oscila
pendendo para o bem.
Então esboço meu poema
a espera da emoção que sempre vem.
Busco a flor que prenuncia
a primavera todo dia
e a cada estação insiste
em provar que ela existe.
Abro a janela…a luz
de um bem-te-vi
a testemunhar o que vê, 
o que vi…
Na leveza de seu voar
a vida fica mais bela
sem o peso a tributar.
Pelos canteiros pouso o olhar,
colho palavras com cheiro,
rabisco versos a exalar,
deixando rastros, sinais…
O sol chega mais cedo, 
acorda os girassóis
e uma ciranda florida
protesta em cantiga
a liberdade das rimas,
pobres ou ricas,
cantando cores, amores e flores.
Então meu olhar silencia.
No papel fala a poesia.

Carmen Lúcia

sexta-feira, 27 de julho de 2018

Procura























Anda!
Faz o que o pensamento manda,
sai da zona de conforto,
busca o que atrai,
o que perdeu, o que se esvai.
Tenta ser feliz…
Quebra o cadeado,
conserta o que há de errado,
derrama o que trava o peito,
deixa ser o que tem que ser.
Nunca é tarde, ainda há jeito.
Não sonhar é o mesmo que morrer.
Mágoas guardadas são grades,
aferram até arder.
Tornam-se holocausto.
Espelham-se no que faz,
embaçam o olhar,
roubam o que satisfaz.
Enferrujam a essência,
entorpecem a mente,
matam gradativamente.
Impedem de viver.
Reage!
Abre a porta de seu interior.
Sopra os desgastes,
varre todos os trastes
que fazem sofrer.
Esvazia o espaço.
Percorre-o, preenche-o com o que apraz.
Dá o primeiro passo.
Outros seguirão o mesmo compasso
até encontrar o caminho
que a leve até você.


Carmen Lúcia

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Só hoje


















Hoje resolvi pausar.
Fico aqui e deixo o mundo pra lá.
Estática, vejo-o rodar.
Livre, com a sensação de não estar…
Leve e a impressão de levitar.
Ser (im)pensante, esquecida do instante,
Isolada do que não posso transformar.
Me volto para mim.
Sou corpo no vácuo
despejado por alguma turbulência.
Não clamo por sobrevivência.
Não chego a ser pânico nem solidão.
O meio termo define meu padrão.
Hoje tiro os pés do chão.
Afasto-me do mundo, dou meia volta,
driblo os solavancos, os engodos, a revolta.
Sou meu próprio piloto
a resgatar micropartículas de mim.
Que a física quântica ou o
poder do pensamento
ou tudo que nos conduz,
façam prevalecer suas leis,
sem distâncias ou anos-luz,
e acelerem a teoria do fim.
(Ou recomeço.)

Carmen Lúcia



quarta-feira, 25 de julho de 2018

Uma nova poesia



















Corre, alcança o pensamento,
lamento não leva a lugar nenhum.
Ele já deu voltas ao mundo,
desencadeou belezas,
do cimo às profundezas,
do céu aos mistérios do mar.
Descobriu terras nunca vistas,
foi senhor de muitas conquistas,
desbravou florestas,
varou por entre as frestas,
trouxe-lhe um raio de sol.
Foi a sua transcendência
enquanto limites podavam seus pés
e o concreto a prendia aqui,
se o que mais queria era seguir.
Deixa esse controle.
Pensamento não se comanda.
Liberta a alma.
Pensamento requer calma,
não anda para trás,
segue como as velas no cais
e qualquer dia não volta mais.
Faz um flashback,
recolhe do passado
os retalhos amassados,
cerzidos em sentimentos sagrados,
os seus momentos válidos
e na somatória com os de agora
recomece sua história…
Junte suas asas às do pensamento
e voe, perdendo-se pelo arrebol…
Veja de perto o pôr do sol
e o nascer de um novo dia.
Carmen Lúcia

domingo, 22 de julho de 2018

Surpreendente


















Surpreende-se consigo mesma.
Durante uma pausa da lida,
num desafogo da vida,
a reflexão.
Em quantas se repartiu?
Não bate a questão.
Esteve lá e cá,
 foi dez, cem, mil…uma porção.
Foi palco da amargura,
riso engabelando o dó…
Foi muitas numa só.
Água de remanso, igarapé,
paragem de aconchego, mulher,
banquete pra muito talher,
resignação, perseverança e fé…
Foi prato vazio, a fome a doer,
a volta por cima, o querer comer,
a dor que alucina, o ter que viver.

Navio a voltar e partir,
horizonte a fechar e se abrir.
Foi chegada.Despedida.
Alma multifacetada,
luta renhida.
Foi o resto da vida
pra se iludir.
Foi filha, esposa, amiga.
A mãe que espera
o milagre surgir,
enquanto ajoelha
pra se redimir.

De quê? Por quê?
Nada teria a vida
a lhe retribuir?
Uma fagulha de sol
e lhe fazer
sorrir?

Carmen Lúcia















terça-feira, 17 de julho de 2018

Causa mortis


















A lágrima já não chora,
 seca ou deixa de nascer,
o riso perde a graça
não há razão de ser…
A dor se fecha em silêncio,
 não mais vigora,
cansa de doer…

O verso que antes sorria
e atrevia a inspiração
de morte quer se prover…
A arte nobre do artista
passa a ser vista
sem admiração…
A sensibilidade,
mãe que gera a verdade,
vira insensibilidade.

O ar rarefeito
impenetra o peito,
defronta o pulmão,
não há mais efeito,
ação, reação…
Não há coração.
Banaliza-se a essência,
de carência o amor se faz,
o homem sem consciência,
petrificado jaz.

Perde-se a ternura
no cais da desventura,
em portos que não se veem mais
a brandura dos abraços,
a tristeza dos jamais.
Auroras perdem belezas,
horizontes embromam linhas,
a morte peregrina,
a vida se desfaz.


Carmen Lúcia




domingo, 1 de julho de 2018

Sem opção

















Faz a bagagem.
Para o próximo voo,
serão suas asas, a experiência.
A que a ensinou voar
com lucidez e (cons)ciência
quando a inlucidez reinar,
 as portas se fecharem
e o desafio entrar.
Ao ficar cara a cara com a vida
sem opção de recuar.
Quando o medo que se sente
e arrepia o ventre
deixa de amedrontar.
Jaz em qualquer lugar.
Agora é encarar.
Se as pernas tremulam
e os pés sangram pedras
lança-se mão do que há,
do que nunca será em vão,
do que eleva e tira o chão
e se perpetua feito espada
na luta contra a disparidade e desunião.
Foram anos de aprendizado.
Voos rasantes, minguados,
até alcançar o sol.

Encara de frente o desafio…
Nem noite escura, nem solidão, nem frio.
Nada que a acovarde a prosseguir,
andar pelo caminho que escolheu,
devolver-lhe a liberdade que perdeu,
 seguir de cabeça erguida
com a leve sensação de que venceu.



Carmen Lúcia