segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Viver sem sonhar



Deixa de lado o coração,
motivos que desencadeiam emoção
com o propósito de não vacilar,
não cair em novas emboscadas
e decidida resolve mudar.
Faz da razão seu itinerário,
bússola que conduz à vida abrupta.
Do rude, seu escapulário,
gládio a proteger o desamor.
Não esmorece, não reverbera,
não se debruça ante a dor mais severa.
Lágrimas não mais salgam seu rosto.
O sal arde e aumenta a ferida,
acalma a alma mas descobre o desgosto
de quem quer encobrir o que sensibiliza.
Fecha-se no invólucro a que se submete,
dopa os sonhos que não querem agonizar.
Suporta.Não fantasiar é o que importa.
Sonhos já não condizem com seus planos
isentos de qualquer desengano.
Não vai muito longe…
Finge crer no que a razão esconde…
Coração em abandono para de pulsar,
razão sem coração não sabe raciocinar.
Melhor voltar atrás…
Viver sem sonhar é retroceder
até morrer.

Carmen Lúcia

sábado, 29 de agosto de 2015

Liberdade tardia




Quantas vezes perdoei...
Mais que setenta vezes sete.
Quem sabe a alma se abastece
e nunca mais venha a sofrer.
Dei minha cara à tapa
sem sequer contradizer
as vontades que preponderaram
e por longo tempo vi prevalecer.
Calei minha boca em consentimento
mesmo com um não na ponta da língua
a explodir a qualquer momento
podendo até reverter minha vida
alterando o argumento.
A covardia e o medo se infiltraram em meu peito
e mais uma vez o não se calou, rejeito.
Mantive o disfarce colado a minha face
e a irrealidade projetando o que não era,
o que não quisera, o que não condissera com a verdade.
Oportunidade perdida não volta atrás.
Mas o tempo é borracha. Apaga e volta a escrever.
Reinventa enredos. As emoções já vividas
deixam o palco e num canto qualquer, vão morrer .
O perdão não tem mais razão de ser.
A história em questão muda o contexto,
os capítulos se compactam, pedem fim,
a mágoa até então guardada, jaz isenta desse texto.
A liberdade concedida passa bem longe de mim.
Feito um pássaro cativo diante da gaiola aberta
sem saber o que fazer, sem ter para onde ir.
Alça um voo rasante, itinerante sem destino.
Retrocede ante a dubiedade dos caminhos...
Tem nas mãos o livre arbítrio,
mas não no cerne o desejo que impele.
A liberdade interior que o libere.

_Carmen Lúcia_.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Expectativas





 Minhas expectativas tantas
superam as possibilidades
(decisiva força tamanha)
de quererem ir adiante.
Morrem no meio da praia,
sequer beijam o mar,
alçam  voo sem voar,
esbarram em sôfrego impulso,
rastejam,  trôpego recurso,
voltam pro mesmo lugar.
E há tanto pra andar!

Minha  vontade de seguir adiante,
 peregrina e radiante,
segue só, dia e noite,
incansável, sem limite
onde o corpo não permite
mas a alma  acompanha…
Sangra meu peito arfante,
fere o ser cambaleante
impedindo-o de ir…
E há tanto pra seguir!

Meus sonhos vagueiam estradas
onde trafegam sorrisos,
palavras e significados,
onde meus dias concisos
pedem pro tempo esperar,
onde meus passos erram
ao tropeçarem nos trilhos
ou a cancela fechar…
deixando muito por acabar.
Onde chegar é preciso
e o sonho pede pra se realizar.
E ainda há tanto pra sonhar!


_Carmen Lúcia_



domingo, 23 de agosto de 2015

Sem rumo

Oh, Deus! Será que enlouqueci?
Transgredi os limites da razão,
Fui além dos sonhos, das medidas da emoção,
E em meio a desequilíbrios e turbilhões
Nem sei quem sou, onde estou, pra onde vou...
Vesti e desvesti inúmeras fantasias.
Transvesti-me de sábia e aprendiz.
Na louca vida de encenação e ostentação,
Querendo ser eu mesma, fui atriz,
Onde ser verdadeira é mera ilusão.
Busquei no túnel escuro a flor do dia,
Para espantar meus medos, fiz poesia.
Subi ao pódio, sem ter vencido a luta,
Tentei me enganar e contornar os fatos,
Fui santa, fui puta...no decorrer dos atos.
Levanto o pano vermelho, me olho no espelho:
Frinéia ou Messalina, Pompadour ou Marie...?
E tenho a sensação de que nunca me vi
Desconheço-me...Silêncio contemplativo...
E permaneço no gerúndio, perdendo-me no infinitivo.
Enfim, a quem recorrer, senão a Ti?
Quando tudo esmorece ainda resta a prece
E a esperança de um dia Te ouvir.
Santa, puta, demente ou carente...
A verdadeira alma a Ti eu esculpi!

Carmen Lúcia/SP

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Pra que palavras?






Pra que palavras
faladas ou registradas,
guardadas no pensamento,
se deturpam-lhes o significado
matam-lhes a essência
calam-nas na escalada
ensurdecidos ante a carência
de serem bem interpretadas
se em tempo algum serão escutadas?
Pra que palavras
se elas voltam sempre
cabisbaixas, indiferentes
ou nunca retornam
levadas pela contundente ilusão
de uma palavra com lábia
e nem são interpretadas
do jeito que as descreve o coração?
Pra que palavras
se quase todas já foram usadas
em sonhos decadentes
paixões desenfreadas
amores já descrentes
em mundos inconvincentes
e viram estátuas
sem anunciarem o que sentem?
Pra que palavras
se quando delas preciso
se ausentam num espaço conciso
deixando-me só, eu e eu,
num cerco onde me confino
com o vazio de se estar só
a confabular comigo mesmo
o desencantamento
de cada palavra que se perdeu.
Prefiro o silêncio que ainda é meu...
_Carmen Lúcia_

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Sem rumo






Não sei se prossigo ou fico,
o que me espera em outra esfera,
não sei explicar o que sinto,
o que quero e espero.
O espaço aqui se estreita,
não capta o que meu coração revela.
Se algum sentimento me resta
ou alguma palavra se presta
a me servir de lenitivo,
ensinar-me outro rumo
sem o amargor do absinto.
Meu pensamento se esparge
sem ter mais onde ancorar,
na primeira muralha bate
como barco sem rumo,
perdido, só quer voltar.
Giro com o mundo veloz
na vagareza de meus passos
e meu descompasso, cruel algoz,
aponta a todo instante o que não faço
sob as cores de um sol radiante
gerando matizes num campo brilhante
que minh’alma ultrapassa e não vê
e minha sensibilidade não mais alcança.
_Carmen Lúcia_

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Meu pai




Meu pai


Quero você comigo
de novo, meu abrigo,
a me apontar caminhos
que perco a toda hora
sem chegar nem ir embora…

Quero você comigo
a refletir, amigo,
o que fazer agora
no decorrer das horas
do tempo que ainda resta
sem ter você aqui…

Quero você comigo…
Deitar minha cabeça
em seu ombro amigo…
Falar de minha vida,
dos sonhos que ainda restam
e  um dia comigo sonhou…
Pedir nova guarida,
pensar que o tempo não passou…

Quero sua presença
repleta de querência,
 presa na lembrança,
trancada em minha memória,
renascida em suas histórias
a me livrar dos medos,
a me pegar no colo
até cessar meu choro
como fazia outrora.

Quero você aqui comigo
para lhe dar um presente
desses que a alma consente 
e o coração persuade
no ensejo de ser verdade…
Porém, “o que tenho pra hoje
é Saudade.”

(Carmen Lúcia)